terça-feira, 4 de agosto de 2015

Oceânicas

Pessoas oceânicas levam para longe e para o fundo tudo o que não se dissolve, mas naufraga; desintegram em fragmentos atemporais aquilo que, sólido, não derrete no ar. Guardam segredos seus e de outros tantos que para lá convergem quando tsunamis. Se dentro do mar tem um rio, dentro dos seres oceânicos há mares constelados.
São de uma preservação única e têm o instinto da maresia quando trazida até o rosto do litoral. Mesmo em tempos bravios, com invasões de piratas, ou ainda quando os dias são de revolta, a marola inebria a quem navegue por águas tão movimentadas e permite o sublime banho em frescas ondulações na várzea mais paradisíaca.
Rotas de ida e de chegada em fluxo profundo, as pessoas oceânicas recebem em seu cais submarinos e navios e fazem se perder em seu infinito, a olho nu, qualquer corpo que habite ou transite em sua imensidão. Imersão na escuridão abissal ou flutuação nas margens mais serenas, o oceano-pessoa cinge-se de deleite e surpresa, sedução pelo encanto cantado que as águas orquestram no concerto de Iemanjá.
Ah, pessoas oceânicas, nas quais os rios desaguam e se tornam infinitos pelo contato, indissolúveis pela existência compartilhada. Nelas, contempla-se também o mistério do insondável – em cima, céu; embaixo e por todos os lados, mares que se unificam –, e é lá e somente lá que, entregues à deriva, tudo é só contentamento e deslumbre. Completando a moldura, o azul alteado reflete-se majestoso, celeste oceano petrificado na abóbada, não a se perder de vista, mas a se perder - encontrado - em vida.

Dividem continentes e arquipélagos, transformam ilhas desabitadas em metrópoles, bifurcam-se em praias, baías e recifes, sofrem com as correntes marítimas e engolfam as marés, levantam-se em ressaca intempestiva e beijam suavemente a areia em ondas eternas. Do oceano onde a vida talvez tenha surgido, nascem em formas concretas de água doce e bebível ramificações a nos deixarem temperados de sal: pessoas feitas oceanos de puro magnetismo – pacíficas em seu atlântico coração índico e jamais glacial – eis o ápice espiritual da criação.

 Éverton de Jesus Santos
Sergipano. Graduado em Letras pela Universidade Federal de Sergipe (UFS), Campus Prof. Alberto Carvalho, Itabaiana/SE, e atualmente vinculado ao Mestrado em Estudos Literários, na área de Literatura e Cultura, desenvolvendo pesquisa relacionada à poesia épica, sob a orientação da Profa. Dra. Christina Bielinski Ramalho. Dedica-se também a escrever crônicas e poemas, bem como a revisar textos acadêmicos.

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